Virginia Fonseca: falcatruas por trás das publis

por Lorena Motter
Virginia Fonseca: falcatruas por trás das publis

Foto: Reprodução internet

Investigação sobre a influenciadora Virginia Fonseca revela várias publicidades e produtos divulgados pela digital que se mostraram enganosos, chegando até mesmo a representar riscos para a saúde de seus seguidores

Por Lorena Kikuti. Imagem: Reprodução.

No dia 4 de Março de 2023, a internet explodia com o lançamento da nova “base da Virginia”. Com o discurso de que a  maquiagem em questão, da marca We Pink,  teria qualidade de produto importado, seria a melhor do mercado nacional e teria função de dermomake, além de ser à prova d´água. A influenciadora digital Virginia Fonseca, a proprietária da empresa, achou justo cobrar R$ 199,90 pelo produto. Não demorou muito para a maquiagem se tornar alvo de críticas entre especialistas e maquiadores, tanto pelo seu preço quanto pela qualidade duvidosa. 

Uma das resenhas que ficou mais famosa foi a produzida por Karen Bachini, maquiadora e youtuber. Karen, no vídeo de uma hora intitulado “POXA VIRGINIA, 200 REAIS?”, aborda detalhadamente a composição da base, faz comparações com outras marcas e realiza um teste prático com água, no qual a base falhou miseravelmente, resultando em uma repercussão ampla na forma de memes na internet.

Conforme um levantamento realizado em 2023, mesmo ano de lançamento da base da We Pink, pelo portal Alta Busca, que avalia produtos e os ranqueia, entre as dez bases nacionais melhores qualificadas, não constava a maquiagem de Virginia, desmentindo a afirmação de que o seu produto estaria acima das outras marcas brasileiras. Além disso, os preços dos cosméticos da lista variavam entre R$16,50 (marca Ruby Rose) e R$89,99 (marca Eudora), um valor muito abaixo do cobrado por Virgínia.  

Também, o termo “dermomake” utilizado pela influencer para classificar a base, e originário de “dermocosméticos”, tornou-se pauta de discussão e foi altamente reprovado. De acordo com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa, o termo não está presente nas leis de saúde em vigor no Brasil e ressalta que a palavra oficialmente reconhecida é apenas “cosmético”. A base de Virgínia é classificada como grau 1, isto é, produtos que têm características essenciais que precisam ser verificadas inicialmente e não demandam instruções detalhadas sobre sua aplicação e restrições de uso. Por serem classificados dessa forma, pode não haver, de fato, elementos dermatológicos e ingredientes adicionais que proporcionem benefícios à pele, como a base sugere.

A partir dessas descobertas, uma investigação exclusiva do Portal Comunicare sobre a influencer revelou muito mais do que uma base que não entrega o que promete. São diversas publicidades e produtos divulgados por Virginia que não passam de enganações, oferecendo inclusive riscos à saúde. 

A influência de Virginia Fonseca

Virginia Fonseca é uma influenciadora brasileira e empresária que produz conteúdo em suas redes sociais abordando temas como moda, beleza, maternidade e principalmente aspectos de sua vida pessoal. Com somente 23 anos, Virgínia é mãe de duas meninas e está grávida do terceiro filho. A digital é casada com o cantor sertanejo Zé Felipe, proprietária de três marcas, entre elas a We Pink, e acumula uma base de fãs impressionante: 78 milhões de seguidores se somarmos o Instagram e TikTok, além de 10 milhões de inscritos no YouTube. No ano passado, ela foi reconhecida como um dos destaques da lista Forbes Under 30. Dessa forma, fechar os olhos e acreditar de que ela não tem poder de influência sobre milhares de brasileiros seria uma grande falácia. 

Mas não seria este o propósito da carreira de influencer, influenciar pessoas?

A carreira de influenciador digital emergiu com a disseminação das redes sociais e a necessidade das marcas de promover seus produtos e serviços de forma eficaz. Como resultado, as empresas estabelecem parcerias com os influenciadores para atingir públicos específicos e, consequentemente, este acordo acabou se tornando a maior fonte de renda dessas pessoas, pelo menos é o que diz o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae). Entretanto, este propósito não escapa de deveres éticos e legais. 

Virginia ganhou destaque por seu uso frequente das redes sociais para realizar publicidades. No entanto, sua reputação tornou-se controversa. As marcas e produtos que ela promove por meio de sua influência têm sido alvo de críticas, denúncias e até mesmo processos judiciais, levantando dúvidas sobre a veracidade das informações e materiais divulgados.

A publicidade enganosa, seja por qualquer meio de comunicação, no caso pelo meio digital, é considerada pela Lei 8.078/1990, publicidade ilícita, enganosa, por mentir sobre as características essenciais do produto, induzindo os consumidores (seguidores) mais fieis do influenciador. 

Maristela de Souza, advogada, professora de Direito do Consumidor da PUCPR e doutora em Direito do Consumidor, afirma que  a influência de uma figura pública digital como a Virginia tem alcance massificado e negativo no público que atinge. Assim, em relação aos anúncios realizados pela influencer, a advogada comenta:

“Espantoso pessoas que ainda acreditam neste tipo de publicidade, sem se certificar da autenticidade das informações. São realmente iludidas, ‘persuadidas’ e ‘encantadas’ pela influenciadora”

Ainda, acerca das responsabilidades legais envolvendo a influencer, a especialista expõe que a digital poderá responder civilmente, responsabilizando-se pelos prejuízos causados às suas seguidoras, que poderão solicitar a restituição do valor do produto, corrigido e danos morais, diante da publicidade enganosa.  Por isso, ressalta: “a influenciadora poderá, também, responder criminalmente, conforme dispõe o Código de defesa do Consumidor em seu artigo Art. 67. Fazer ou promover publicidade que sabe ou deveria saber ser enganosa ou abusiva: Pena Detenção de três meses a um ano e multa”.

Denúncias 

Um dos princípios essenciais da publicidade no Código de Defesa do Consumidor, é o Princípio da Identificação Publicitária, ou seja, a publicidade deve ser identificada de tal forma que o consumidor a identifique imediatamente e claramente. A advogada Maristela de Souza adverte: “a não identificação poderá induzir os consumidores em erro, causando-lhes prejuízos de ordem material e moral, de maneira que serão objeto de indenização por parte do anunciante, neste caso a influenciadora digital”. 

O Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar), no Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária, estipula regras fundamentais para a vinculação de um anúncio. Os pilares para a fundamentação do regulamento se encontram na transparência, respeitabilidade, decência, entre outros, durante um anúncio. Ao não respeitar essas normas e princípios, o anunciante e os relacionados à propaganda se tornam passíveis a receberem denúncias que acarretam em advertências administrativas cabíveis. 

Assim, é possível perceber que a influenciadora Virginia Fonseca atende a diversas questões relacionadas a publicidades enganosas ou realizadas de formas divergentes ao que está regulamentado, pois, ao buscar seu nome (Virginia) no Conar, aparecem diversas denúncias que citam sua participação. A título de exemplo, segue as três acusações mais ranqueadas expostas pelo próprio órgão (Conar): 

Caso New White (produto – clareador dental):

Anúncios em mídias sociais de clareadores dentais da New White protagonizados por influenciadores, entre eles a Virgínia, foram alvo de denúncia de três consumidores por identificação publicitária deficiente. Isto porque a propaganda dos influencers divulgava apenas um cupom de desconto, não informando de forma explícita a ocorrência da publicidade. 

Além disso, os produtos da New White foram advertidos pelos Conselhos Regionais de Odontologia de Pará e Pernambuco,  a Anvisa e o Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor/Secretaria Nacional do Consumidor considerando-os de risco à saúde quando indicados sem orientação profissional. 

O julgamento ocorreu em abril de 2021. O relator, o Conselheiro Rubens da Costa Santos, propôs a alteração dos anúncios em questão, da inserção da informação sobre a importância da orientação de profissionais dentistas na propaganda, tanto para o anunciante quanto para os influenciadores, além de advertência, e seu voto foi aceito por unanimidade. 

Caso Happy Hair (produto – complexo vitamínico que ajuda no crescimento e fortalecimento dos cabelos)

O anúncio do Happy Hair, protagonizado por Virginia em suas redes sociais, gerou queixa de consumidor no Conar. A pessoa considerou que a publicidade não estava identificada apropriadamente, o que é uma exigência do Código do Conar e questionou a veracidade das informações. 

Para ilustração da defesa, o trecho presente no relatório do conselho atesta: “A defesa de Virginia Fonseca considera facilmente perceptível a natureza publicitária das postagens objeto desta representação, inclusive pela menção a custos de frete e cupons de descontos. Considera também não haver abuso de confiança, sendo o produto registrado junto às autoridades sanitárias e as informações técnicas bem conhecidas pelo público. Também a Happy Hair enviou defesa ao Conar, discorrendo sobre o produto e seus efeitos, admitindo que eles podem variar de pessoa para pessoa. A defesa reconheceu lapso na questão da identificação publicitária das peças”. 

Mesmo assim, a relatora Conselheira Patricia Picolo admitiu deficiência nas postagens vinculadas ao Happy Hair pela influenciadora, aconselhando a sua alteração. Ainda, em relação a veracidade das informações, considerou o produto inconclusivo em pesquisas e benefícios, solicitando modificação também. 

O julgamento aconteceu em março de 2021 e levou à advertência da marca Happy Hair em voto aceito por unanimidade. 

Caso Le Perry Paris (produto – Healthy Brain, capinha de celular que impede efeitos da radiação eletromagnética): 

A peça publicitária divulgada por Virginia afirma que o produto da empresa Le Perry Paris, o Healthy Brain, uma capinha de celular, protege os consumidores de danos causados pela radiação eletromagnética empreendida por aparelhos celulares e outros. É importante ressaltar que esses benefícios não são comprovados cientificamente. 

Sete denúncias de consumidores foram registradas, elas questionam a veracidade do anúncio. Além disso, também denunciaram, novamente, em mais uma publicidade da influenciadora, a deficiência presente na identificação publicitária da propaganda. 

A anunciante defende que as afirmações são respaldadas por estudos, enquanto a influenciadora afirma que o anúncio está alinhado com o Código, mas decidiu suspender sua veiculação até que o Conselho de Ética se pronuncie. 

O relator, o Conselheiro Murilo Nassif, concluiu que o anúncio não cumpre as diretrizes éticas da publicidade em relação à sua identificação adequada e, portanto, recomendou alterações, sendo apoiado unanimemente. Em relação às declarações sobre desempenho, o relator considerou a presunção de boa-fé por parte do anunciante.

Para mais informações sobre esses e mais diversos outros casos envolvendo a influencer, acesse o link do Conar e busque pelo nome “Virginia”: http://www.conar.org.br/

Além das publicidades, a personalidade de destaque da internet demonstrou perspicácia ao estabelecer mais uma fonte de renda ao fundar a marca de cosméticos We Pink em 2020, em colaboração com Samara Pink, uma especialista consolidada no ramo estético.

We pink 

A We Pink é uma marca de cosméticos e perfumaria com venda majoritariamente online e quiosques dispostos em shoppings. 

A inspiração para criar a empresa veio quando a influenciadora enfrentou problemas de acne durante a gravidez de sua primeira filha, Maria Alice. Assim, criou-se a essência e o emblema da marca:  “A We Pink veio para inovar o conceito beleza e a importância do cuidado com a sua pele com uma tecnologia única!”. Porém, como visto anteriormente, alguns produtos vendidos como dermomake não são necessariamente produtos com classificação dermatológica, vide exemplo a base. 

Dessa forma, ações relacionadas à empresa de Virgínia também são fonte de desaprovações e acusações graves. Ao adentrar no portal Reclame Aqui, um espaço livre e recomendado para realizar suas queixas sobre uma marca ou produto e obter respostas dos responsáveis, notam-se mais de 6 mil reclamações sobre a We Pink. 

Percebe-se que as principais reivindicações estão relacionadas ao atraso ou não entrega de um produto e a insatisfação com a qualidade ou defeito no conteúdo recebido. 

Apesar das constantes críticas e denúncias, a WePink alcançou impressionantes R$ 10 milhões de faturamento no primeiro mês de sua abertura e R$ 15 milhões durante uma live de 12 horas, segundo dados fornecidos pela própria influencer, configurando, de certa forma, um sucesso empresarial. 

Essa situação vai muito além de uma base cara e mal feita, são diversos produtos entregues com pouca ou nenhuma qualidade, ou até mesmo, não entregues. É mais uma evidência de que Virgínia não cumpre o que promete. 

 

 

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