Produções paranaenses ganham mais espaço nos streamings

Com mais plataformas de streaming disponíveis, a indústria audiovisual cresce em Curitiba com destaque a nível nacional e internacional, garantindo até indicações em festivais mundiais.
Por: Ingrid Caroline, Isabela Lobianco, Julia Moreira e Mariana Gomes.
No último ano, o número de assinantes em plataformas de streaming, como a recém lançada Star+, Netflix e Amazon Prime, cresceu 36%, segundo o estudo da Kantar IBOPE Media. Com o aumento no número de assinantes e o lançamento de outras plataformas, os conteúdos paranaenses ganham destaque entre as produções das plataformas disponíveis. O filme “Alice Júnior” (Netflix), produzido em Araucária do Sul, e a série “O Caso Evandro” (Globo Play) representam produções relevantes no meio.
“Alice Júnior” revela o cotidiano de uma adolescente transgênero que sai de Recife para uma pequena cidade fictícia no Paraná depois que seu pai é transferido por conta de seu emprego. Diferentemente de outras produções sobre a temática, a obra de Gil Baroni retrata a realidade de Alice com leveza e cor, num cenário em que a protagonista é empoderada e tem o apoio de sua família.
Com o aumento de espectadores, outro número que cresce é a quantidade de produções brasileiras que estão disponíveis nos catálogos. “Irmandade”, produzida pela Netflix, “O Bem-aventurado” e “Contracapa”, produzidos pela Amazon Prime, e outras produzidas pela GloboPlay, são algumas das produções paranaenses nos streamings de maior relevância no Brasil.
O seriado “Irmandade” possui cenas filmadas em Piraquara e propõe uma reflexão entre a justiça brasileira e as facções criminosas. Já a animação “O Bem-aventurado” é baseada no conto “A Conversão do Diabo”, do russo Leonid Andreiev, que retrata questionamentos sobre o que é o bem e o que é o mal. Transmitida pelo mesmo streaming de “O Bem-aventurado”, “Contracapa” é uma série policial filmada em Curitiba que revela os bastidores de uma redação jornalística.
Em entrevista, Guto Pasko, o diretor da GP7 Cinema e da série Contracapa, revela que a série foi gravada inteiramente em Curitiba em razão do custo. “Tinha equipe técnica qualificada, os atores vêm da PUC e da FAP que tem qualidade, o custo de trazer atores é grande em hospedagem e gera outros custos que necessitam de orçamento. O custo final é 30% mais barato do que no Rio de Janeiro ou São Paulo”, explica Guto. O diretor conta mais detalhes da produção em Curitiba: “A vantagem é que em cenas externas, conseguíamos fechar qualquer rua ou quarteirão, em qualquer dia e horário para filmar. Fora que conseguimos buscar paisagens incríveis que reconstituem qualquer parte do mundo”.
Além da localidade das filmagens, o elenco também é composto totalmente por atores curitibanos ” Temos 107 atores, todos de Curitiba”. Ainda, Pasko diz que nem sempre é possível ter autonomia no momento de decidir o elenco. “É natural que [as emissoras] queiram uma figura da grande mídia para vender. É assim que as emissoras sobrevivem.”
Além da relevância nacional, as plataformas permitem que essas produções sejam consumidas no mundo todo, facilitando o reconhecimento internacional. O filme Alice Júnior, representante desse feito, foi premiado no Festival de Berlim 2020, Festival do Rio e Festival Norte Americano aGLIFF. Recentemente, o filme Deserto Particular, filmado em Curitiba e na Bahia, recebeu o Prêmio do Público BNL 2021 na mostra do Festival de Veneza.
Como incentivo, a prefeitura de Curitiba financia o Festival Internacional de Curitiba, o qual já levou mais de 130 mil pessoas para as salas de cinema e exibiu mais de 800 filmes de todo o mundo. Além disso, a Unespar e a PUCPR investiram na criação de cursos específicos de Cinema e Audiovisual.
Guto Pasko acredita que é fundamental mostrar a diversidade do país: “Até pouco tempo só existia o eixo Rio-São Paulo e alguns estereótipos do Nordeste”. Pasko usa Contracapa como exemplo, já que a série não se trata de uma temática regional, mas universal. “O figurino é sempre de inverno para mostrar a paisagem da cidade e os costumes como elemento de defesa na hora da venda. Não é igual, é algo novo, uma visão diferente do Brasil”.
O jornalista, escritor e roteirista Marden Machado fala que é extremamente importante ter produtos audiovisuais do Paraná sendo disponibilizados em plataformas de streaming e comenta que a Secretaria de Cultura do estado lançou um site chamado Paraná Cultura, onde vários produtos estão disponíveis, tanto audiovisuais, como musicais, literários, teatrais, e várias manifestações culturais e artísticas das mais diversas disponíveis gratuitamente nesse portal. “Isso [o site] abre um espaço para que essas obras sejam mostradas, divulgadas e outras plataformas pagas, serviços de assinatura de streaming têm colocado em seus catálogos filmes produzidos aqui no Paraná e até séries, como é o caso de Contracapa”, comenta o jornalista. Marden destaca que vários outros trabalhos podem ser encontrados em diferentes serviços de streaming além da plataforma do Governo do estado. “Quanto mais espaço o artista tiver para mostrar sua arte, todo mundo sai ganhando”.
A popularidade do streaming ajudou o cinema em tempos de pandemia
Desde 2014, os brasileiros apresentam-se como crescentes consumidores no ranking de streamings. Entre 2016 e 2018, o aumento no consumo foi de 130%, o que colocou o Brasil entre os dez primeiros países na tabela, em sexto lugar. Com o fechamento dos cinemas por causa da pandemia, o streaming tornou-se o meio principal para lançamentos e consumo de filmes e séries.
A produtora e escritora Bia Crespo comentou que a pandemia piorou ainda mais um ramo que já estava debilitado antes. “O fechamento dos cinemas devastou uma parte enorme da indústria audiovisual, principalmente a brasileira, que já estava bastante debilitada depois dos cortes de incentivos e ausência de políticas públicas”. Segundo Bia, o cinema brasileiro ainda não se sustenta apenas da bilheteria e que, depois da pandemia, precisou procurar outros meios de seguir existindo sem essa entrada de dinheiro também. A produtora cita o próprio filme que escreveu em 2019, 10 Horas Para o Natal: “Estava previsto para ser um sucesso de bilheteria no fim de 2020 – foi o primeiro filme de Natal brasileiro a ser lançado nos cinemas. A expectativa era de 1 milhão de ingressos vendidos, mas não fez muito mais que 20 mil. Já o Tudo Bem No Natal Que Vem, do Paulo Cursino, lançado na mesma época na Netflix, foi assistido por milhões de pessoas no mundo inteiro”.
Já sobre os streamings, a roteirista vê como uma das salvações do cinema brasileiro e que o estudo mostra bem como o cinema e o streaming performaram durante a pandemia. “O crescimento das assinaturas de plataformas de conteúdo foi vertiginoso nesse período.” Bia complementa: “Se não fosse a existência dos streamings no Brasil, nosso audiovisual teria sido praticamente extinto.”
Por fim, Guto indica que o poder público precisa entender o setor audiovisual como indústria e destravar as linhas do financiamento. “Pouca gente sabe que o PIB da cultura é maior do que o turismo, maior do que a indústria têxtil, farmacêutica. Gera emprego e muito dinheiro. Falta esse entendimento”, revela o diretor. Bia explica que o fechamento da Embrafilme em 1990 gerou o desemprego de toda a classe, além de quase extinguir o audiovisual: “Os streamings nos salvaram, pois quem trabalhava com cinema acabou migrando para lá. O problema é que nem sempre tem lugar para todo mundo e, com isso, a procura por trabalhos ficou maior que a oferta”.
Onde assistir as produções locais
Alice Júnior: Now, Looke, Vivo Play, Box Brazil, Google Play, Apple iTunes e Netflix.
O Caso Evandro: Globo Play.
Contracapa: Looke e Amazon Prime Video.
Irmandade: Netflix.
Bem-aventurado: Amazon Prime Video, Looke, Google Play e Apple iTunes.
Deserto Particular: em breve disponível na Pandora Filmes.