Processo de transição capilar une cuidado com a saúde e empoderamento

O processo de abandono da química tem ganhado espaço entre as mulheres que decidem mudar de hábito
Por Sofia Magagnin
Uma pesquisa divulgada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em janeiro deste ano apontou que os salões de beleza brasileiros utilizam o formol de forma irregular em procedimentos químicos. Mais de 35% dos fiscais sanitários consultados relataram ter encontrado o uso irregular de formol em produtos que alisam o cabelo. Prejudiciais para a saúde, os alisantes têm preocupado as mulheres que decidem parar de utilizar química também por questões pessoais que envolvem autoaceitação.
Cabeleireira, tricologista e professora universitária, Karla Michelle Bodziak trata as patologias que atingem o couro cabeludo. A profissional explica que o formol está presente nos salões há mais de uma década e que, devido ao custo baixo, utilizar o químico em procedimentos estéticos se tornou muito vantajoso. Além disso, acredita que os cabeleireiros que atuam na área da beleza seguem utilizando o produto por falta de conhecimento sobre seus malefícios. “O formol é altamente carcinogênico, ele sintetiza no fígado e não sai mais. A fumaça afeta outras pessoas devido à toxicidade do produto. No cabelo, ele se torna um acrílico e tira toda a propriedade natural que o fio tem”, alerta.
Sem contraindicação, a transição capilar, como ficou conhecido o processo de abandono à utilização de química e aceitação do cabelo natural, ganhou espaço entre as mulheres. A tricologista destaca que esse movimento também se dá porque as empresas de cosméticos se adaptaram às necessidades das cacheadas.
A fotógrafa Fernanda Santos decidiu não fazer mais parte da parcela de mulheres que frequentemente alisam o cabelo com química. Com histórico de sofrer bullying por conta do cabelo crespo, ainda adolescente e com a autorização dos pais, decidiu alisar o cabelo fazendo um tipo de escova progressiva com formol. Fez o procedimento durante 10 anos. A mudança de hábitos, o cuidado com a saúde e a popularização do movimento de autoaceitação foram fatores que influenciaram a tomada de decisão de assumir o cabelo natural.
Durante a transição capilar, sofreu com a autoestima, pois não conseguia lidar com as duas texturas do cabelo ao mesmo tempo, e isso afetava sua imagem pessoal. “A transição parece simples, mas envolve muitos sentimentos. É uma coisa profunda”, relata. Para amenizar as dificuldades, utilizou técnicas de texturização que mudam a forma dos fios sem precisar de química ou calor. Além disso, a fotógrafa conta que adquiriu muito conhecimento e se inspirou em mulheres que compartilham conteúdos sobre transição capilar na internet.
Um exemplo é o blog Cacheia, que surgiu em 2013, acompanhando a tendência de compartilhamento de experiências em redes sociais. Hoje, com mais de 200 mil seguidores e mantido por quatro mulheres, o site centraliza em um único lugar todas as informações sobre transição capilar e dicas para cuidados com o cabelo.
Integrante do Cacheia, Mariana Boaretto acredita que todas as seguidoras têm uma visão parecida sobre a transição e defendem a bandeira da autoaceitação. “Acreditamos que a transição é uma das ferramentas mais fortes que a mulher tem de transformação, porque é você ir contra tudo que aprendeu a vida inteira, a sociedade, a mídia, a família e a estrutura que a gente vive hoje”, conta. Para as responsáveis pelo blog, é importante debater a construção da sociedade sobre o padrão de beleza imposto e também a cobrança em relação ao papel da mulher.
Salões para cacheadas em Curitiba