Pesquisa indica que 66% das estudantes da rede pública estão sofrendo de ansiedade

Top view portrait of a woman lying at the desk near the laptop. Education, business concept photo. Lifestyle
Do ensino fundamental ao médio, elas também sofrem com irritação (45%) e estão mais tristes (39%) que os meninos durante o período de aulas remotas, segundo pesquisa do Datafolha
Por Gabrielly Dering
Segundo pesquisa recente realizada pelo Datafolha, 66% das estudantes da rede pública do ensino fundamental e médio que possuem acesso às atividades remotas estão ansiosas. Em 2015, o Instituto Nacional de Psiquiatria do Desenvolvimento para Crianças e Adolescentes aferiu que 7% das pessoas entre 6 e 16 anos em todo o Brasil sofriam de ansiedade. O cenário de pandemia e a dificuldade de adaptação ao ensino público remoto, além da conciliação da escola com as tarefas de casa e por vezes até com empregos, podem estar levando essas meninas a sentirem-se mais impactadas psicologicamente que os meninos e jovens de outras realidades sociais.
Apesar de ainda haver cerca de 5 milhões de jovens na faixa etária dos 9 aos 17 anos sem acesso à internet em casa no Brasil (TIC Kids Online 2019: Fundo das Nações Unidas para a Infância), o número de estudantes do 1º ao 9º ano e ensino médio da rede pública que recebem atividades pedagógicas para fazer em casa aumentou para 79% durante o período de pandemia. Junto com as demandas da escola, as meninas também sentiram aumento nos problemas emocionais.
A estudante Leticia Ramos , que cursa o 3º ano do ensino médio integrado com técnico em contabilidade do Instituto Federal do Paraná (IFPR), conta que suas aulas à distância começaram oficialmente em junho deste ano. A aluna diz que está conseguindo acompanhar, mas há dificuldades em manter o foco: “Com certeza me sinto muito mais desanimada e ansiosa, fora as distrações da casa e o fato de eu trabalhar no contraturno às minhas aulas.”
A chamada dupla jornada feminina vira um problema triplo para as estudantes, coisa que não é exclusiva da pandemia. “Assisto às aulas de manhã, trabalho a tarde e chego cansada a noite em casa, que é quando preciso estudar para o vestibular.” Aos finais de semana, ajuda nas tarefas de casa, fazendo faxina, almoço e lavando roupas. Letícia diz que chegou a pensar em desistir do vestibular este ano, mas não deixará de completar o ensino médio.
A evasão escolar têm preocupado principalmente as camadas mais pobres da população, a realidade em que as meninas mais precisam trabalhar e/ou realizar atividades domésticas. Cerca de 29% dos estudantes com renda mensal de até 2 salários mínimos temem pelo abandono e 60% pela dificuldade de acompanhar o volume de atividades das aulas online.
As aulas da rede pública não são online, mas gravadas, o que acaba formando uma barreira na comunicação. A professora de ensino médio e fundamental II Soraya Trevizani de Castro concorda que, nessa questão, as meninas demonstram mais dificuldades: “Elas têm sofrido muito. Eu vejo os meninos tranquilos, fazendo as atividades da forma que dá. Já as alunas se frustram, reclamam e ficam menos de recuperação.”
Para a psicóloga Carolina Roveda, existem muitas justificativas para o sentimento ansioso entre as meninas. Um dos pontos importantes é a sobrecarga das mães solo, que hoje representam mais de 11 milhões de mulheres no Brasil, de acordo com o IBGE. Essas mães precisam de ainda mais ajuda durante a pandemia. “Geralmente elas delegam mais tarefas para suas filhas e isso causa atrito, aumentando a ansiedade e irritação”, diz Carolina.
“Vivemos numa sociedade patriarcal, em que ser menina significa ter que fazer as atividades domésticas. Mais tempo em casa pode se traduzir para alguns pais como mais tempo para ajudar.” Segundo a psicóloga, a cultura do machismo que faz com que os homens sejam menos livres para expressar sentimentos também pode refletir nos dados.