Movimento Negro faz manifestação no prédio histórico da UFPR

A organização e a luta dos movimentos negros para pautar a luta contra o racismo em Curitiba
Por Amanda Cristina e Tayná Luyse | Foto: Amanda Cristina
Em um ato que foi organizado pelo Movimento Coalizão Negra por direitos e que fez parte de manifestações que ocorreram por todo país na última quinta-feira (13/05), manifestantes de Curitiba se reuniram em frente ao Prédio histórico da UFPR (Universidade Federal do Paraná) com o intuito de reafirmar a luta antirracista, denunciar a violência contra corpos negros e exigir a vacina. Segundo a organização do evento, o ato contou com a participação de aproximadamente 300 manifestantes.
Nicole de Oliveira, 21 anos, uma das organizadoras do movimento Enegrecer Paraná falou com a reportagem sobre a importância de ressignificar a data de hoje como um símbolo de luta e não comemoração.
“A abolição da escravidão no Brasil veio de um processo de luta, organização e resistência dos quilombos, libertação essa que foi apenas institucional. Os negros e negras deixaram de ser escravizados, mas foram colocados as margens da sociedade, sem direito a moradia, a vida, saúde e educação, fomos jogados a condições sub humanas de existência. Não existíamos, apenas sobrevivíamos, e hoje 133 anos depois essa abolição segue inacabada”, afirmou.
Além do ato realizado em Curitiba, cidades dos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo também foram as ruas com intuito de denunciar principalmente a violência contra corpos negros, uma reação de repudio após a chacina que ocorreu na comunidade de Jacarezinho no Rio de Janeiro.
A desigualdade para além de casos isolados
Dos 8 milhões de desempregados no Brasil, entre o primeiro e segundo trimestre de 2020, ao menos 70% da população é negra, segundo o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).
Em 2018, os negros representaram cerca de 75% das vitimas de homicídio no país, essa taxa representa 37,8 homicídios a cada mil habitantes, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Comparativamente, entre os não negros essa taxa foi de 13,9; ou seja, para cada um individuo não negro, 2,7 negros foram mortos.
As taxas de homicídio aumentaram em 11,5% para os negros, entre 2008 e 2018. Em contrapartida, as pessoas não negras tiveram diminuição de 12,9%, conforme o Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea).
Professor afirma que Curitiba busca transmitir uma imagem europeizada
O professor de Ciências Sociais da PUCPR Sergio Luiz relata sobre a visão do “padrão cultural europeu” que se tem em Curitiba. “É muito triste porque é uma cidade que se orgulha muito das imigrações, se orgulha muito da contribuição de povos europeus”. Ele fala ainda que os órgãos públicos deveriam trabalhar com a diversidade.
“Se você vai fazer homenagem a um grupo, um órgão público deveria ficar atento para tentar fazer homenagem a todos os grupos. A cidade tem cerca de 24% de sua população negra e a forma como a cidade lida é mostrada nos dados de casos de racismo que muitas vezes aparecem.”
Para o educador, a principal comparação que liga a sociedade atual com a do ano de 1888, é o fato das pessoas ainda verem a população negra como ‘objeto’ e não como sujeito.
“Durante um tempo até tinha-se uma ideia de o 13 de maio ser um momento de reivindicação e tudo mais, só que ele caiu por terra. Hoje as instituições não dão tanta relevância a data. Se no dia 13 de maio de 1888 os negros não foram os protagonistas, atualmente neste dia continuamos não protagonistas. Talvez seja por isso que não fazemos tanta questão de ressaltar esta data.”
Representatividade política negra na cidade
A vereadora Ana Carolina Dartora, primeira mulher negra a ocupar essa posição política em Curitiba, diz que é gratificante ter essa representatividade do cargo. “Acredito que isso é resultado da luta histórica que o movimento de mulheres negras. Mas também o fato de ser a primeira e única impõe muita responsabilidade e resistência.”
Dartora conta que já recebeu ataques racistas e ameaças de morte por estar participando da política da cidade.
“A razão disso é o racismo estrutural e institucional entranhado em nossa sociedade. Há um atraso muito grande em políticas de combate à desigualdade racial. Depois de minha denúncia sobre isso, o prefeito enviou o Plano Municipal de Promoção da Igualdade Racial à Câmara de Vereadores. No entanto, observamos que esse plano ainda exclui itens fundamentais, como o acesso à moradia.”
Quando questionada sobre o histórico da cidade conectado com uma ‘cultura europeia’, a vereadora afirma que isto é real. “É só perceber a estrutura da cidade e como ela se organiza, como os monumentos e praças mais imponentes são em alusão à cultura e países europeus, bem como existe uma invisibilidade da contribuição negra na cidade.”