Jogador de vôlei Maurício Souza reacende a discussão sobre política e esporte

Após o fim da primeira olimpíada sem medalhas no vôlei masculino desde 2004, o jogador Maurício Souza gerou polêmica nas redes sociais ao agradecer Jair Bolsonaro pelo apoio.
Por Ingrid Caroline, Isabela Lobianco, Julia Moreira e Mariana Gomes
A Comitê Olímpico Brasileiro (COB) voltou para casa não somente com a melhor posição com 21 medalhas conquistadas na história no quadro do torneio, mas com um antigo dilema: os atletas e o posicionamento político. Além de levar a atenção do povo aos atletas nacionais, o grande envolvimento do público com o evento fez com que o posicionamento político de vários esportistas voltasse à tona, como aconteceu com o ponteiro da seleção de vôlei masculino Maurício Souza, que publicou em seu Instagram um vídeo agradecendo à torcida de Jair Bolsonaro e o presenteou com a camiseta da seleção.
O jogador foi criticado por seu apoio ao atual presidente do Brasil. Além dos comentários intolerantes em sua própria página, o atleta também teve seu passado revirado, relembrando comentários homofóbicos e preconceituosos que já havia publicado. Outros casos como o de Maurício foram lembrados pelo público, entre eles os atletas Felipe Melo, volante do Palmeiras, e Wallace, oposto da seleção brasileira de vôlei que também competiu pelo Brasil nas Olimpíadas de Tóquio.
Por outro lado, as olimpíadas também marcaram atletas que se posicionaram contra o presidente. Entre esses, Paulinho, jogador da seleção de futebol e do Bayer Leverkusen (Alemanha), manifestou em suas redes sociais o descontentamento com o governo e declarou ser favorável ao impeachment. As jogadoras Marta e Tamires, da seleção feminina de futebol, também já fizeram postagens criticando a postura de Bolsonaro.
O maior motivo do ataque aos atletas que apoiam o presidente é o descaso que tem sido feito com o esporte no governo atual. Para Marcos José Zablonsky, professor de Relações Públicas da PUCPR, atletas que se posicionam como Maurício estão desconectados da realidade que os esportistas brasileiros vivem. “O que a gente percebe é que há claramente uma contradição entre o elogio, e quase uma deferência que o atleta Maurício, quase desconectado da realidade que a gente vive social, econômica e até esportivamente”, comenta. “É emblemático por ele não entender o contexto social, econômico e político que estamos vivendo”.
Ammynah Laden Melo, jogadora do Clube Curitibano, comenta que a decisão de Maurício é muito particular, mas que as manifestações políticas são necessárias. Além disso, a atleta acredita que o esporte não deve ser transformado em uma guerra política. “O pódio pode servir como um palanque político para incentivar o governo quando estiver fazendo o certo e para criticar quando não estiver”, acrescentou.
O Professor Marcos ressalta que gosta quando os atletas se posicionam, como Marta, jogadora da seleção brasileira de futebol feminino, que faz questão de levantar o que é necessário para conseguir os melhores esportistas para representar o país após cada vitória. Zablonsky destaca Richarlison como outro atleta que se posiciona contra o governo Bolsonaro. “Ele não cita nomes, mas cita o governo e deixa claro que questões aqui no Brasil precisam ser olhadas com mais atenção”. Pessoas com visibilidade internacional como Marta e Richarlison dão luz ao estado do esporte nacional e das dificuldades pelas quais passam os atletas para chegar ao pódio olímpico, o que é de extrema importância para o cenário esportivo do Brasil.
Sucessivos cortes marcam o esporte brasileiro
No último mandato de Michel Temer, aproximadamente 413 milhões de reais foram repassados ao Ministério do Esporte. Já no primeiro ano de governo de Jair Bolsonaro, este número caiu para 225 milhões de reais, porém, no ano dos Jogos Olímpicos, o orçamento cresceu para 310 milhões de reais. Vale lembrar que o Ministério do Esporte deixou de existir no começo do governo Bolsonaro e passou a ser uma secretaria especial anexa ao Ministério da Cidadania.
Quanto aos valores destinados às olimpíadas, o valor investido no ciclo da Rio 2016 foi cerca de 470,9 milhões de reais, enquanto, no ciclo Tóquio 2021, esse valor chegou a 464 milhões. Além disso, um levantamento do Governo Federal junto ao G1 aponta que o valor das bolsas pagas aos atletas não passa de 11 mil reais para atletas que chegam ao pódio olímpico. Daniel Cargnin, Kelvin Hoefler, Rebeca Andrade e Bruno Fratus são exemplos de medalhistas que recebem auxílio do Bolsa Atleta, assim como Daniel Carollo, campeão estadual de karatê aos 13 anos, que começou a receber uma bolsa da prefeitura de Curitiba aos 14 anos. No entanto, a bolsa foi cortada em 2015 devido à remodelação das normas da bolsa, que passaria a contemplar apenas atletas de modalidades olímpicas.
Atualmente, Daniel é professor de artes marciais e educador físico e acredita que a bolsa é um grande incentivo, pois permite que o esportista invista em viagens e equipamento para competir. Carollo ressalta que o Brasil tem uma carência no esporte e, mesmo assim, possui atletas destaque em vários esportes. “O corte de gastos só desmotiva cada vez mais o atleta”. Por fim, o atleta lamenta: “É triste saber que o governo está cada vez mais desvalorizando o esporte”.
Ammynah destaca que o corte de orçamentos diminui a revelação de novos talentos e a oportunidade de acesso aos melhores treinamentos, o que faz com que apenas atletas dos grandes centros ou com recursos próprios para estar nos grandes centros recebam a oportunidade de estar nas olimpíadas. “O esporte cada vez mais depende de políticas públicas para sobreviver e, se quisermos que nossos atletas cheguem a condições olímpicas, precisamos de um governo com incentivos cada vez maiores”, aponta a jogadora do Clube Curitibano.
O Professor Zablonsky enfatiza que a maior parte do dinheiro usado para financiar o esporte vem de empresas privadas que escolhem patrocinar os jogadores: “Não é porque as estatais financiam uma parte dos esportes olímpicos que a gente está realmente sendo atendido pela política de financiamento do esporte”, afirma.