Falta de educação sexual para crianças e adolescentes aumenta risco de abuso e IST´s

por Valentina Silva Nunes
Falta de educação sexual para crianças e adolescentes aumenta risco de abuso e IST´s

Vítimas de abuso sexual infantil e, também, de IST pedem por uma educação sexual mais aprofundada na grade escolar

Por Lorena Motter, Maria Fernanda Dalitz, Natália Volaco , Valentina Nunes

Foto : Reprodução

Stories de Wesley Safadão  viralizaram após acusações de abuso infantil, revelando a importância da educação sexual no ambiente escolar voltada para, além da parte biológica, a porção social.

No vídeo postado pelo cantor, o pastor André Vitor, amigo da família de Wesley, surge por trás de uma menor e coloca suas mãos muito próximas aos seios dela. A menina se solta e o homem aparece abaixando a camisa logo em seguida. A movimentação suspeita do religioso fez com que internautas apontassem um possível caso de abuso infantil. Após a repercussão, as postagens foram deletadas.

Stories polêmicos do Wesley Safadão :https://youtu.be/xxbtiTDUVzw

 

O Governo Federal junto com o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH) atualizou, esse ano, cartilha com informações sobre abuso sexual infantil. A cartilha revela que em 2020 o Disque 100 teve 95,2 mil denúncias de violência contra crianças e adolescentes. Os registros corresponderam a 368.333 violações e incluem violência física, psicológica, abuso sexual físico, estupro e exploração sexual. Dados retirados da Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos (ONDH), responsável pelo serviço no MMFDH.

No Paraná , dados da Secretaria de Segurança Pública do Estado(SESP), apontam que entre indivíduos de menos de 1 ano de idade até os 17 anos, ocorreram no primeiro trimestre de 2021, 4986 violências sexuais contra eles. Entre elas, foram feitas 3.931 ocorrências de estupro de vulnerável, 469 de importunação sexual,375 atentado ao pudor e 211 de assédio assexual. Além disso, o apontamento mostra que de todas as cidades do Paraná, Curitiba lidera em casos de abusos contra a criança.

Mesmo com números elevados de denúncia no estado, a educação sexual nas escolas é precária. De acordo com parecer da Secretaria Municipal de Educação (SME),O assunto Educação Sexual não é trabalhado como um disciplina isolada, em nenhuma das escolas e não se restringe ao âmbito individual ou psicoterapêutico, mas preconiza as múltiplas dimensões da sexualidade.

Os temas abordados sobre o assunto são dentro da matéria de ciências/biologia, os conteúdos ensinados são: Sistema Genital, HIV, IST´s, gravidez e hormônios e sexualidade. Voltando o ensino do tema para um âmbito mais biológico, deixando de lado os aspectos emocionais e protetivos do assunto.

A Pedagoga e Psicopedagoga Clínica e Institucional, Isabella Del’ Conti afirma que,
“Grande parte dos casos de abusos foram identificados por professores ou funcionários da escola, que são obrigatoriamente denunciados ao conselho tutelar. A maioria desses abusos são cometidos por entes familiares, por isso acredito que a criança desde cedo precisa aprender sobre a diferença entre afeto e abuso e sobre conhecer o próprio corpo, assim poderão se proteger de possíveis assédios.”

 “As pessoas ainda tendem a confundir o que realmente é a educação sexual, muitos por falta de informação ou até mesmo por motivos religiosos, acreditam que tocar no assunto é uma forma de ensinar seus filhos a praticarem ou ter curiosidade sobre relações sexuais.” diz Isabella

Ela afirma que além de orientar as crianças, deve-se orientar os pais também. Muitos ainda não sabem ou acreditam ser um tabu conversar com seus filhos e que isso pode prejudicá-los em longo prazo. Por isso, ela acredita que além de a escola promover a orientação dessas crianças, precisam também orientar essas famílias sobre assunto. A junção desses dois pilares, escola e comunidade, são de extrema importância para que casos de abusos sejam denunciados e evitados.

Adriane Mussi, psicóloga especializada em sexualidade humana firma que a educação sexual deve começar desde cedo de maneira gradual e pertinente. Cada fase do desenvolvimento tem suas curiosidades e possibilidades de compreensão. Respeitar cada tempo e falar sobre os assuntos com tranquilidade possibilita a educação em sexualidade de maneira adequada.

A psicóloga também constata que crianças que tiveram essa educação tem mais facilidade para denunciar casos de abuso.

 Uma das estratégias que são utilizadas  no abuso é culpabilizar a vítima ou se utilizar do vínculo com a criança ou com a família dela para pedir “segredo”. Assim, se a criança souber que algo inadequado aconteceu  se sentirá mais segura para contar aos seus responsáveis, e terá mais facilidade em denunciar.

 

Educação sexual evita contaminação por ist´s em jovens

Acredita-se que além de evitar um possível caso de abuso sexual infantil, previne gravidez precoce e principalmente IST’s (infeções sexualmente transmissíveis). Conforme os dados do Boletim Epidemiológico HIV/Aids revelaram aumento de 64,9% das ISTs entre jovens de 15 a 19 anos  e de 74,8% para os de 20 a 24 anos, entre 2009 e 2019. Além do mais, atualmente ocorre uma epidemia de sífilis no Brasil, de acordo com Boletim do Ministério da Saúde (MS) de outubro de 2020, o número de casos de sífilis por transmissão sexual, passou de 3.925 em 2010 para 152.915 em 2019, principalmente na faixa de 20 e 39 anos.

Juliana Lemes, 20, estudante de enfermagem. Após ter contraído sífilis e gonorréia aos 16 anos, atualmente utiliza as redes sociais para falar sobre a importância da educação sexual e conscientizar os jovens sobre IST’s (Infecções Sexualmente Transmissíveis). 

A estudante diz que uma das causas do aumento de jovens com infecção nos últimos anos, é principalmente a falta de visibilidade para esse assunto. As campanhas sobre a conscientização estão ficando cada vez mais apagadas, por isso é essencial ser ensinado nas escolas, desde pequeno, sobre a educação sexual, obviamente sem expor conteúdo sexual para crianças. Sendo essencial apresentar desde cedo e não apenas aos 18 anos, ensinando as partes do corpo que podem ou não serem tocadas, sobre o consentimento, ensinar a dizerem não quando se sentirem desconfortáveis. Assim que o indivíduo for amadurecendo, conversar sobre gravidez precoce, sensibilizar sobre as IST’s e cuidados que devem ser tomados. Dessa forma, orientar sobre o assunto em cada fase da vida é muito importante.

Ela ainda  relata que se houvesse educação sexual na época em que foi contaminada, não teria cedido à vontade de seu parceiro de não utilizar preservativo, sob justificativa de que não havia necessidade. “Infelizmente é culturalmente ensinado que os homens são superiores e têm mais experiência no assunto ”. Por isso, Juliana ressalta que é importante ensinar a mulher a dizer não e se respeitar nesses momentos.

Influenciador digital conta a sua história de abuso sexual infantil

Gustavo Rocha, influencer e  ativista, em seu perfil no instagram (@afro_guga)  debate abertamente assuntos cruciais, tais como: cultura do estupro, masculinidade tóxica, racismo e, também, abuso sexual infantil. Gustavo é uma vítima de abuso sexual infantil e, considerando sua história, fala sobre a importância da educação sexual na infância.

Ele comenta que a educação liberta, emancipa , por isso, é essencial colocar esses temas sociais na escola e, também, no âmbito familiar. Gustavo, diz que a criança não tem noção de que o abuso é errado e que, sem a educação sexual, perde-se o alerta elucidado do perigo. Ele revela que, na sua época, a educação sexual trabalhada no ambiente escolar era muito biológica e que os professores tinham preconceito para falar sobre o assunto.

O ativista  fala que quando o indivíduo passa pelo abuso não consegue perceber que aquilo foi errado e se sente ameaçado pelo abusador, gerando uma série de dúvidas  que ela não consegue fazer algo a respeito. Expõe também que vítimas de abuso, geralmente denunciam ou contam sobre a  violência após anos, devido a insegurança e preconceito que está instalado na sociedade. Sendo assim, percebe-se a importância e necessidade da educação sexual nas instituições escolares, para que as crianças sejam ensinadas do que é certo e errado em relação ao próprio corpo e onde devem ou não serem tocadas por outra pessoa, da mesma forma, alertá-las do perigo da situação. Com isso, auxilia as crianças identificarem o que é e como denunciar uma violência sexual.

Para denunciar violência sexual infantil

As principais maneiras são:

  • Disque 100 – qualquer cidadão pode fazer uma denúncia anônima sobre casos abuso infantil pelo Disque 100. A denúncia será analisada e encaminhada aos órgãos de proteção, defesa e responsabilização em direitos humanos, respeitando as competências de cada órgão.
  • Aplicativo Proteja Brasil– após instalar o app gratuito em seu smartphone, o usuário, respondendo um formulário simples, registra a denúncia, que será recebida pela mesma central de atendimento do Disque 100. Para acompanhar a denúncia, basta ligar para o Disque 100 e fornecer dados da denúncia.
  • Ouvidoria Online– O usuário preenche o formulário disponível na plataforma e registra a denúncia, que também será recebida pela mesma central de atendimento do Disque 100. Para acompanhar a denúncia, basta ligar para o Disque 100 e fornecer dados da denúncia.
  • Conselho Tutelar– essa instituição é responsável pelo atendimento de crianças e adolescentes ameaçados ou violados em seus direitos. Pode aplicar medidas com força de lei. A denúncia pode ser feita por telefone ou pessoalmente, na sede do conselho. É possível encontrar o telefone do Conselho Tutelar mais próximo digitando “Conselho Tutelar + o nome do seu município” no Google.

 

 

 

 

Autor