Estresse causado pela quarentena intensifica violência doméstica

por Leonardo Henrique da Silva Costa
Estresse causado pela quarentena intensifica violência doméstica

Estudos apontam que casos de abuso doméstico se tornaram mais ocorrentes durante o isolamento social.

Por Helene Mendes, Leonardo Henrique e Paula Braga Goveia

O isolamento social no Brasil afetou diretamente o comportamento humano, acarretando o agravamento de violência e agressões domiciliares. As mulheres, confinadas em casa, são o principal foco desse tipo de consequência negativa causada pela quarentena.

A estudante de enfermagem Ana Clara Garcia Cola, relata sobre os abusos verbais e físicos sofridos no período atual. Ela diz que notou maior irritabilidade do parceiro por estar confinado, e que o mesmo apresentou surtos de estresse e impulsividade violenta. “Não consegui sair. Porém consegui identificar o abuso que sofria com as agressões físicas, surtando por nada, quebrando meu celular ou pegando uma faca para me ameaçar.” Ela revela, também, que sua família sabe dos acontecimentos e aconselha as mulheres vítimas que denunciem imediatamente. “Nos primeiros sinais peça ajuda”.

Em abril, quando a quarentena ultrapassava um mês, a quantidade de casos de violência contra a mulher cresceu em quase 40% em relação ao mesmo mês de 2019, segundo dados do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMDH).

Os casos também se destacam no estado do Paraná, onde ocorreu um aumento de 8,5% no 1o semestre de 2020. Já em Curitiba, no mesmo período, houve o crescimento de 1.56%, foi de 2.023 casos para 1.992 nos três primeiros meses do ano anterior.

Apesar do maior volume de denúncias, o aumento da violência doméstica desapareceu das estatísticas dos órgãos de segurança pública. A promotora Valéria Scarance, coordenadora do Núcleo de Gênero do Ministério Público do Estado de São Paulo, afirma que a redução do número de casos durante a quarentena pode ser um reflexo da dificuldade da vítima em fazer a denúncia, estando no mesmo ambiente do agressor em tempo integral.

“A queda que houve nos boletins de ocorrência e processos no período de pandemia não corresponde à realidade das agressões.”

Ela acredita que as vítimas estão com dificuldade de sair de casa para denunciar ou pedir ajuda. ‘‘As vítimas podem estar sofrendo a violência doméstica por mais tempo’’, afirma Valéria.

Buscando uma solução para esse problema, Juliana Emerique, delegada e diretora da Divisão de Polícia de Atendimento à Mulher (DPAM), contou que a Polícia Civil irá inaugurar um novo canal de atendimento para mulheres vítimas de agressão, através do Canal 197.

Ligando para o número, é possível fazer a denúncia de ocorrências anonimamente pelo telefone, sem sair de casa.

“A gente não quer que chegue na morte. Para que isso não aconteça, a gente tem nessa época de pandemia um serviço especializado no que tange às mulheres. É o número 197, que a pessoa pode fazer o registro pelo telefone. É uma inovação para essa época de pandemia.”

No Paraná, essa ferramenta se encontra virtualmente, onde há a possibilidade de se fazer o Boletim de Ocorrência (B.O) pela internet. Com exceção em casos de violência sexual, este serviço pode ser encontrado pelo site oficial da Polícia Civil, onde foi oficializado em 3 de junho deste ano.

 

O lado psíquico

A psicóloga especialista em terapia sistêmica Giovanna Borba, explica: “com o prolongamento do isolamento, a falta de interação foi afetando diretamente as pessoas, do ponto de vista emocional e até mental. Houve um aumento significativo dos níveis de ansiedade, estresse, tristeza, depressão, pensamentos e ideação suicida, entre outros sintomas.”

“Somos acostumados há milhões de anos a viver na coletividade, em comunidade, com trocas e interações sociais. Quando nos foi instituído o ‘isolamento social’, significou uma ruptura abrupta das relações que temos desde que nascemos.”

Ela também relaciona a ocorrência dos casos de abuso doméstico com problemas mentais intensificados pela falta de interação; “devido a pandemia, muitas pessoas têm procurado ajuda psicológica, pois houve aumento no nível de ansiedade e estresse ou até brigas no ambiente familiar. Por mais que vivemos em comunidade, também não estamos acostumados a ficar “presos” dentro de casa com as mesmas pessoas por cerca de 3 ou 4 meses”, afirma Giovanna.

O psicanalista André Tarques discorre: “vejo que o emocional de cada sujeito ficou comprometido, pois o isolamento fez com que as pessoas sintam falta uns dos outros. Seres humanos não nasceram para viverem sozinhos. Sabemos que o ser humano é capaz de se adequar e recriar quando necessário, e estamos vendo isso acontecer no dia a dia, o que é importante para sobrevivência, seja ela mental ou financeira.”

“Hoje, vejo que a humildade, empatia e solidariedade é a esperança para um mundo melhor. Tiraremos desta situação um belo aprendizado, olhando para um mundo soberano, maior que nós seres humanos.”

 

Tipos e sinais de violência contra mulher

A Lei Maria da Penha, sancionada há quase 14 anos, prevê cinco formas de violência: física, psicológica, sexual, patrimonial e moral.

Sinais como comportamento controlador por parte do parceiro, frustração com expectativas irreais em relação à parceira, grosseria, atitudes exageradas, crueldade (com todos os residentes da casa) e hipersensibilidade (em que tudo ofende o parceiro) são traços de alerta.

Como denunciar

A Delegacia da Mulher continua funcionando normalmente, além disso sempre estão disponíveis para ligações emergenciais para o número de telefone 190.

Denúncias são recebidas pelos números 180 e 181.

Na capital paranaense, o telefone da Delegacia da Mulher é: (41) 3219-2600, além do site oficial da Polícia Civil, onde se pode fazer o boletim de ocorrência online.

Outros números para apoio nessa situação: (21) 23328249 (Disque Mulher), 127 (Ministério Público).

Outras formas de proteção são, se possível, avisar familiares e amigos de confiança sobre a situação, deixar os números de emergência anotados, planejar uma saída para um local seguro ou até um hospital se for o caso. Também é de interesse separar itens de emergência para o caso de ter que sair ou fugir rapidamente (chaves, documentos e dinheiro, por exemplo).

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