Atletas de Curitiba batalham para manter viva luta livre na cidade

Conhecido nacionalmente como telecatch, esporte era a luta mais popular do Brasil.
Por Enzo Bacarin e Mariana Toneti | Foto: Joe Hernandez / Unsplash
Entretenimento, esporte, acrobacias, espetáculo circense e combates roteirizados são as várias definições que a luta livre pode ter. Um dos maiores sucessos das décadas passadas, ainda está presente e busca a volta para os holofotes brasileiros. Desde 2015, Curitiba é uma das cidades que têm uma pequena parcela de luta livre com a Pro Wrestling Curitiba, cujo propósito é unir lutadores e passar mais conhecimento. O projeto começou com apenas uma lona esticada no Parque Barigui e, hoje, tem o próprio ringue e parceria com outras equipes da luta livre nacional.
Com a pandemia prejudicando atividades em academias, a frequência de treinos está reduzida. A organização conta com cerca de 11 lutadores, cinco deles alunos novos. Com uma periodicidade menor, as gravações são realizadas uma vez por mês para o canal no YouTube, o qual já acumula 16 mil visualizações. Para o dono e lutador da Pro Wrestling Curitiba, Chris Wolf (Cristian Neves), o maior desafio foi encontrar um lugar fixo e coberto para os treinos.
Além disso, Wolf cita que o preconceito com a modalidade começou com a descoberta dos roteiros. “O público da velha guarda acabava ofertando um produto ao público como algo ‘real’ e não como um entretenimento, algo cênico”. No entanto, antes da descoberta, os circos e festivais eram frequentados por empresários e apoiadores da luta livre, eventos típicos paranaenses, como a Festa da Uva, foram ringues do espetáculo nas décadas passadas.
Produtor do documentário Carrascos – Artistas do Ringue, Túlio Viaro diz que a luta livre ainda está muito presente em circos itinerantes e cidades do interior. Entretanto, é possível achar um QG no Capão Raso, a academia Ben Hur, usada para manter a história e a luta nos tempos atuais.
A academia, de 35 anos, leva o nome de lutador do proprietário Altair, Ben Hur, e conta com um dos maiores acervos da luta livre brasileira (telecatch). O lutador costumava fazer shows em exposições pelo estado, como a Expoingá e Expo Curitiba. Para manter a modalidade, dão aulas particulares esporadicamente para alunos interessados. Acredita que um dos maiores desafios da luta atualmente é a parte artística, uma vez que o lutador precisa dominar a arte cênica e cativar o público.
Telecatch | Foto: Cintia Siqueira/ Arquivo
A luta livre – também chamada de lucha libre, professional wrestling ou pro wrestling – é considerada uma modalidade esportiva focada no entretenimento do público, uma mistura de artes cênicas, com golpes e ações planejadas, além de papéis de personagens pré-estabelecidos para os lutadores.
No início dos anos 60 e até o fim da década de 90, o telecatch, nome dado à luta livre brasileira na época, era uma atração requisitada, chamava atenção nos ringues e na televisão, com os mocinhos e vilões. No México e Japão, a luta livre faz parte do acervo cultural da população; já os Estados Unidos são considerados o epicentro da luta livre, movimentando milhões de dólares todos os anos.
Apesar do declínio que a modalidade viveu, Chris Wolf acredita que a luta livre nacional voltará a crescer. Atualmente, a emissora SBT transmite, com cinco dias de atraso em relação à data do evento, um compacto de 45 minutos do programa RAW, um dos shows da maior empresa de luta livre no mundo, World Wrestling Entertainment.
O programa é exibido nas madrugadas de sábado para domingo (02h15 às 3h00). Além disso, o programa é exibido em formato menor diariamente (03h45 às 04h00). Doze anos após a volta para a emissora nacional, o show, que sofreu mudança de horário depois dos primeiros episódios, atingiu a média de 5.1 pontos de pico no ranking do Ibope – cada ponto equivale a 75 mil pessoas sintonizadas. A Fox Sports transmite todos os shows do WWE, sendo os dois principais (RAW e SmackDown) ao vivo.
OS ASTROS DO TELECATCH
O ex-lutador e tricampeão brasileiro de luta livre, Bob Léo passou por dezenas de lugares em Curitiba com seus espetáculos, além de lutar com outros grandes nomes da modalidade, como Big Boy. Costumava exibir seus shows na antiga TV Iguaçu e totalizou 58 anos de carreira.
Começou cedo na luta. Com 14 anos, já praticava no Rio de Janeiro: “O circo era todo dia, de segunda à segunda; na segunda a gente ia ao café, onde marcava a luta e só trabalhava se tivesse revanche. Era o dia de acertar luta pro circo”, diz o ex-lutador. “No sábado, só lutava quem não tava escalado para televisão.” Havia cerca de 80 lutadores escalonados para o espetáculo semanal.
Atualmente, Bob Léo está afastado há quatro meses por ter feito uma cirurgia. Desde que emagreceu 25kg, está se preparando para voltar aos ringues para fazer uma despedida.
À esquerda, Bob Léo, o neto e Bob Júnior, filho e proprietário da BWF | Foto: Cintia Siqueira/ Arquivo
Outro nome da época é Átila, pseudônimo de Mauri Waldemar Schultz, que fazia espetáculos no centro de Curitiba e no interior do Paraná. O show consistia em duas partes: na primeira metade, acontecia o telecatch e, na segunda, as acrobacias e apresentações circenses. Fazia um papel de vilão – chamado de “base”- e, por isso, não era um dos favoritos do público. Além disso, considera Big Boy uma de suas “crias”.
Em Curitiba, Átila fez aparições no clube Duque de Caxias e na Festa da Uva, e totalizou 18 anos de carreira. Acredita que o telecatch acabou pela mudança de programação. “O telecatch acabou aqui porque eles nos tiraram do horário que o empresário necessitava. Era horário nobre, das 21h às 23h. A emissora começou a passar e investir nas novelas no mesmo horário, então os empresários não aceitaram e tudo acabou”, diz Átila.
O ex-lutador deixou a carreira por sua profissão: era mestre de obras e, por acontecer muitas viagens, ele não podia perder dias de serviço. Considerava o telecatch um hobby.
PARA SABER MAIS DE LUTA LIVRE
GLOW: é uma série de comédia no universo de luta livre profissional feminina. Está disponível na Netflix (https://www.netflix.com/title/80114988)
Série GLOW, da Netflix | Foto: Matty Winkelmeyer/ Getty Images
Carrascos – Artistas do Ringue: produzido por Túlio Viaro, o documentário relata a vida de lutadores e ex-lutadores de telecatch. Tem como foco o cenário paranaense e o trabalho incomum que exerciam na época. Está disponível no YouTube (https://www.youtube.com/watch?v=u9j2DwrWElw).
O Lutador (The Wrestler): o filme norte-americano retrata a vida de um lutador veterano (interpretado por Mickey Rourke) que tenta retornar ao ringue após anos, ao mesmo tempo, pretende reatar relações familiares e amorosas. O ator protagonista foi indicado ao Oscar. Está disponível na plataforma Netflix (https://www.netflix.com/title/70095145).
Lutando Pela Família (Fighting With My Family): neste filme, a história da lutadora Paige é contada, acompanhamos a busca pela realização do sonho de chegar à WWE. The Rock, ator e ídolo da luta livre, além de atuar como ele mesmo, ajudou na produção. O longa está disponível no Telecine Play (https://www.telecineplay.com.br/filme/Lutando_Pela_Familia_17192).
Nacho Libre: o filme retrata a vida de Ignácio – personagem do ator Jack Black -, que sempre morou em um monastério, onde existe um orfanato instalado. Desde pequeno, ele é apaixonado pela lucha libre, algo que seus superiores não permitem, por se tratar de um “esporte violento” e que iria contra os dogmas religiosos. Mesmo assim, escondido, Ignácio continua com seu sonho de um dia se tornar um luchador famoso. Disponível para alugar ou comprar no YouTube (https://www.youtube.com/watch?v=k0wFdmBIPaI).
Monstros do Ringue: neste outro documentário brasileiro, são resgatadas histórias e personagens do passado de glória do telecatch e retrata o momento atual, mostrando o dia a dia das equipes. O longa foi vencedor na categoria de melhor documentário segundo o júri popular na 39ª Mostra de Cinema de São Paulo, em 2015.