Apenas 30% dos presos fazem atividades se preparando para o retorno a sociedade

Egressos encaram dificuldades para voltar ao mercado de trabalho após cumprir a pena
Por Lamartine Lima e Larissa Miglioli
Sair da prisão e continuar fora dela não é uma tarefa simples para muitos dos ex-detentos que obtém a liberdade. Embora o trabalho e o estudo sejam algumas das ferramentas para ressocialização, segundo os últimos dados divulgados pelo Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), em 2017, apenas 20% dos 574 mil presos no país trabalham e 9% estudam.
Após ganhar a liberdade, os ex-detentos se deparam com o preconceito e com a falta de oportunidades no mercado de trabalho, pois há receio de empregadores em contratá-los por conta de seus antecedentes. Muitos conseguem emprego apenas por indicação sem mesmo que o patrão saiba do passado desta pessoa.
Daniela, 34 anos, tem duas passagens pela polícia, cumpriu pena pelo crime de estelionato, no presídio feminino de Piraquara e no CT1 (Centro de Triagem 1) em 2012. Daniela conta que teve dificuldades para conseguir um emprego por conta do receio que vários empregadores têm em contratar ex-detentos. Após várias tentativas, Daniela conseguiu por indicação um emprego de cozinheira.
A ex-detenta conta que além da dificuldade para obter um trabalho, também enfrentou inúmeras adversidades em sua vida particular. “Tive dificuldades para conseguir a minha casa própria e poder comprar as coisas com o meu dinheiro. Passei por várias complicações até que finalmente, consegui. Eu tenho um filho pequeno e antes eu não podia dar as coisas para ele, mas agora, graças a Deus, eu estou conseguindo”.
A ex-agente penitenciária Viviane Oliveto acredita que não há uma preparação adequada para que os detentos possam retornar ao convívio social. “É preciso mudar a mente de nossos governantes, para que criem oportunidades e os ex-detentos possam ser inseridos novamente no mercado de trabalho”.
Segundo o diretor geral do Departamento Penitenciário (Depen), Luiz Alberto Cartaxo, o sistema de reintegração existente no Estado não chega a todos os presos. “Infelizmente não é possível atingir todos por conta da quantidade de detentos e de toda a demanda de trabalho que isso exige”.
Cartaxo salienta que apesar das falhas existentes no processo de reintegração do detento em sociedade, o Paraná está à frente dos demais estados. “Hoje temos 25% da população penitenciária do estado trabalhando e 44% estudando, números que nenhum outro estado apresenta”.
Educação como meio de reinserção
Muitos dos ex-detentos veem nos estudos um recomeço, já que dados divulgados pelo Ministério da Justiça em maio de 2016, apontam que 75% dos 726 mil detentos possuem apenas o ensino fundamental completo, o que dificulta na obtenção de emprego.
Esse é o caso de Edson Dias, 29 anos, que cumpriu pena por roubo na Casa de Custódia de Curitiba. Dias viu nos estudos e na leitura uma forma de ressocialização, segundo ele essas ferramentas ajudaram em seu recomeço. “Quando sai só tinha em mente voltar a estudar. Tinha apenas o fundamental completo, hoje curso o médio e até ajudo meu filho nos deveres de casa”.
Dias agora planeja terminar os estudos e conseguir emprego melhor. “Hoje vivo de bicos, e depois que completar os estudos pretende ir atrás de um trabalho melhor e quem sabe até entrar na faculdade”.
Empresário contrata detentos
O empresário Carlos Humberto de Souza emprega atualmente 70 detentos na empresa em que administra. Para Souza oportunidades assim são essenciais para a ressocialização dos detentos. “Todos têm o direito de se recuperar e merecem uma segunda chance. Além disso, é uma grande oportunidade para a empresa, já que a mão de obra é barata. Ambos os lados ganham com isso”.
O administrador ainda incentiva outros empresários a fazerem o mesmo. “Seria ótimo dar essa condição de recuperação social a cada vez mais pessoas. É necessário dar oportunidades para que esses detentos não voltem para o mundo crime”.
Ex-detento ajuda ex-colegas
Depois de quatro anos preso, o ex-detento Oscar Moreira, 42 anos, decidiu recomeçar de uma maneira diferente. Assim que saiu da prisão, em 2007, ele fundou a ONG Amigos Nova Jerusalém Organização Social (Anjos), que fica no bairro São Miguel, em Curitiba.
O administrador da ONG conta que o preconceito e dificuldades encontradas por ex-detentos como ele, o motivaram a dar início ao projeto. “Existe um preconceito muito grande das pessoas com os ex-detentos. Ninguém quer ajudá-los”.
A ONG oferece assessoria jurídica e psicológica aos ex-detentos, e também auxilia as famílias dos presos, tudo para que o detento se ressocialize e não volte ao crime.