Curitiba recebeu 63 denúncias contra exploração do trabalho infantil no primeiro trimestre de 2024

Abordagem social realizada pela FAS.
Maior incidência de denúncias são nos bairros da Regional Matriz
Por Thaynara Goes | Imagem: Reprodução/FAS.
Indo em direção ao Hospital Pequeno Príncipe, localizado na região central de Curitiba, Jefferson Portugal observa uma situação já habitual em seus anos de experiência atuando na Fundação de Ação Social (FAS). Alguns pequenos grupos de famílias, sendo a maioria composta por mãe e filhos, se agrupam em torno do hospital pedindo doações de dinheiro para comprar mantimentos para subsistência. Não muito longe dali, cada vez mais próximo do coração da cidade e das zonas comerciais, outro acontecimento também já não é mais estranho à realidade da capital e a rotina de Jefferson: crianças, boa parte das vezes desacompanhadas buscando se misturar na multidão para vender doces ou pedir doações.
Essas situações se repetem por toda cidade. Durante o primeiro trimestre de 2024, Curitiba recebeu 63 denúncias de exploração do trabalho infantil através da plataforma 156. Metade delas foi registrada na Regional da Matriz, com 32 casos. Jefferson Portugal explica que esse volume se deve ao grande fluxo de pessoas na região central da cidade durante os dias úteis da semana: “Quando eu tenho um movimento maior […] que é das pessoas que vão trabalhar, que vão para consulta médica, de turistas e de residentes que vão passear na região central, há um esvaziamento dos bairros do entorno e superlotação da regional da matriz, e também um direcionamento do trabalho infantil para essa área.”
Portugal afirma que esses dados possuem cobertura limitada, se restringindo apenas aos dias úteis da semana. Porém, de acordo com sua experiência, nos fins de semana a movimentação muda e a circulação de pessoas – e consequentemente os casos de exploração do trabalho infantil – aumenta em bairros turísticos, como Santa Felicidade.
Quando essas denúncias são feitas por meio do canal 156, elas são redirecionadas para a FAS, que é o principal órgão que realiza a prevenção e acolhimento dos casos de exploração do trabalho infantil em Curitiba. Após esse encaminhamento, é acionado o Serviço Especializado de Abordagem Social da regional onde foi identificado o caso para iniciar o procedimento de abordagem da criança ou do adolescente em vulnerabilidade.
Perfil dos casos
Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua), em 2022, havia 1,9 milhão de crianças e adolescentes de 5 a 17 anos em situação de trabalho infantil no Brasil, o que corresponde a 4,9% da população com a mesma idade. Além disso, a maior incidência é de crianças e adolescentes do sexo masculino (65,1%) e de pretos ou pardos (66,3%).
No Paraná, mais especificamente, havia 112.441 crianças e adolescentes de 5 a 17 anos em situação de trabalho infantil no ano de 2019, conforme o relatório do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil do Paraná (FNPETI-PR). Além disso, este documento também ajuda a traçar o perfil dessas crianças e adolescentes. Em termos de idade, 66,548 meninos e meninas tinham entre 16 e 17 anos, o que corresponde a 59,2%, mais da metade dos casos paranaenses. Segundo o relatório, também havia mais meninos em situação de exploração, aproximadamente 69.284 meninos e 43.156 meninas. Já em relação à raça, 57,5% eram não negros (64.636) e 42,5% eram negros (47.805).
Em Curitiba, Jefferson observa um padrão semelhante. A maior incidência continua sendo de meninos, mas em uma idade de pré-adolescência, na faixa de 12 e 13 anos: “Raramente nós fazemos a abordagem de meninas […] a grande maioria são meninos adolescentes em situação de mendicância, pedindo doações ou vendendo doces”.

Esta reportagem foi desenvolvida na disciplina de Jornalismo Investigativo do curso de Jornalismo da PUCPR.