Exposição da dupla “Os Gêmeos” reacende debate sobre grafite

Polêmica com bisneto do arquiteto Oscar Niemeyer traz novo capítulo ao debate sobre o grafite no Brasil
Por: Isabella Naime, Isadora Miranda, João Américo e Luis Gustavo Schuh Bocatios
O debate sobre a situação do grafite no Brasil foi reacendido após o bisneto do arquiteto Oscar Niemeyer ter publicado críticas a uma obra realizada em um dos trabalhos arquitetônicos expostos no museu que leva o nome de seu avô.
Em nota publicada em seu Instagram, o também arquiteto Paulo Niemeyer declarou: “Foi com tristeza que vi o que fizeram na obra do meu bisavô […] o que os gêmeos fizeram, pelo desrespeito à obra de Oscar, agride aos olhos e a alma.”
Mesmo se dizendo a favor do grafite como expressão artística, o arquiteto finalizou a nota dizendo que “(os gêmeos) no mínimo deveriam ter respeito pela arte e criação de Niemeyer, da mesma forma que ele, Oscar, teve com todo e qualquer artista.”
Procurada pela reportagem, a direção do museu enviou uma nota dizendo que “a obra, de caráter reversível e temporário, não afeta a volumetria do edifício, não utiliza parafusos ou outros materiais que possam afetar a estrutura ou as características do projeto arquitetônico”, e ressaltou que “instituições do mundo inteiro fazem ações semelhantes para promoção dos espaços culturais e de novas mostras”.
O artista Michael Devis, nome importante do grafite na capital paranaense, atribui a polêmica à falta de entendimento de Niemeyer sobre o caráter temporário da obra.
Devis ainda acrescentou que “o espaço é um local expositivo, então, um arquiteto que faz uma obra a nível mundial e pensa em arte, como Oscar Niemeyer, acho que não iria se importar com a intervenção”.
O episódio surgiu como mais uma evidência de que o grafite ainda está longe de ser tratado de forma adequada no Brasil. Sobre o assunto, Devis opinou: “[…] o grafite consegue ser valorizado em alguns meios, não em todos, e ainda precisa ser tratado de forma mais ampla, pois as pessoas gostam de classificar que o que é bonito é grafite, e o que é feio não é, e essas rotulações não são legais para a arte.”
O artista relatou experiências negativas que passou enquanto trabalhava em grafites. “Quando a gente está pintando na rua, em qualquer lugar, várias pessoas passam te xingando e te olham diferente. Discriminado a gente é quase todo dia. As pessoas te olham diferente só por você estar com uma lata de spray na mão”.
Marginalização do grafite remete a outros movimentos vanguardistas
De acordo com a professora de artes, Jackeline Martins, é discutida no Brasil a questão da estética do grafite. “Ao longo da história da arte, diversas manifestações artísticas foram duramente criticadas. Movimentos artísticos de vanguarda, como cubismo e expressionismo, foram muito criticados desde o início”.
Para Jackeline, a trajetória do grafite como expressão artística pode vir a ser parecida. “Assim como o grafite, há pessoas que podem olhar de forma generosa e encontrando seu potencial, assim como outras podem olhar e descartar, baseando-se em um padrão de julgamento estético que elas definiram para si ou a sociedade impôs”, refletiu a professora.
Grafite democratiza a arte
O Estúdio Grafite Curitiba é uma instituição que desenvolve projetos e trabalhos nas áreas de artes visuais, grafite, decoração, criação e pintura artística, utilizando diferentes formas e técnicas.
Um dos responsáveis pelo estúdio, Edson Lima, refletiu sobre a importância sociocultural do grafite: “A cultura do grafite vem para mudar o cenário urbano, trazendo uma nova realidade para as cidades com artes em todas os lugares. A missão do grafite é se apropriar de todos os espaços”, declarou.
Para a professora Jackeline Martins, o papel do grafite na sociedade é muito importante, visto que, muitas vezes, o grafite se comunica com a população que não tem acesso à galerias de arte ou ambientes museológicos, por conta da tarifa de entrada, deslocamento, ou então, como na maioria das vezes, uma falta de identificação, por não compreenderem o que está sendo exposto, e se afasta da experiência da visita em um museu.
Exposições
Sobre a exposição dos grafites nos gêmeos, Jackeline refletiu: “Como professora de artes e alguém muito interessada por visita em museus desde criança, eu sinto muito por poucas pessoas em Curitiba visitarem e frequentarem o museu Oscar Niemeyer enquanto ambiente de exposições, para realmente conhecer o acervo e exposições itinerárias que entram em cartaz.”.
Para Jackeline, o museu é apenas conhecido por sua moderna obra arquitetônica, e é muito visitado apenas por causa dela. No entanto, poucos realmente entram no museu. Ajudar a mudar isso, para ela, é uma tarefa, e, como professora, pretende quebrar o paradigma de “eu não entendo de arte” ou “arte não é para mim”.
“As manifestações artísticas fazem parte de um patrimônio histórico cultural humano que diz respeito de onde viemos e para onde vamos.”, declarou Jackeline.
Datas das exposições
As exposições da dupla “Os Gêmeos” está aberta a visitantes de Terça a Domingo, das 10h ás 18h, tem ingressos ao preço de 20 reais e continuará no MON até o dia 16 de abril de 2022. Para mais informações, acesse o site do museu Oscar Niemeyer clicando aqui.