Políticas de distribuição de absorventes não avançam no país

por Julia Mello Marcelino
Políticas de distribuição de absorventes não avançam no país

Apesar de crescerem iniciativas voltados ao tema, poucas medidas são aprovadas e  a sustentabilidade não entra em pauta

Por Eduardo Veiga, Julia Mello e Vanessa Guimarães 

Propostas que buscam a distribuição do absorvente têm dificuldade em serem aprovadas. A falta de acesso ao item para a população de baixa renda gerou diversos projetos em todo o país nos últimos anos, como o que está na Câmara de vereadores de Curitiba e aguarda posicionamentos do poder executivo desde março. A distribuição se relaciona com temas como educação sexual e direitos das mulheres, considerados tabus da sociedade. E os impactos ambientais ainda não entram na discussão.

Um levantamento feito em 2018 pela empresa Sempre Livre aponta que 22% das meninas entre 12 e 14 anos não têm acesso a absorventes no Brasil. Dentre as jovens de 15 a 17 anos, 26% não possuem condições de comprar o item. Segundo o movimento Girl Up, ligado à fundação ONU, no Brasil o absorvente é tributado como cosmético e não como item de saúde e higiene básica, gerando custos excessivos.

Além da Girl Up, outros movimentos têm apoiado projetos pelo país, como o Direito Pra Todas. Iniciativas recentes, como da deputada estadual Arlete Sampaio (PT-DF), definem como “pobreza menstrual” a falta de acesso ao absorvente por razões financeiras.

A proposta que está pendente em Curitiba, apresentada em dezembro de 2019, é de autoria do vereador Rogério Campos (PSD). O projeto alega que muitas estudantes, por conta da menstruação, faltam às aulas, em média, 25% do ano letivo. “Muitas vezes não sobra dinheiro para ter o item, fazendo com que os pais motivem a filha a faltar a aula”, diz o vereador. O atraso no andamento do projeto se dá por falta de opiniões das secretarias de saúde e educação, que já foram solicitadas duas vezes. A SMS não respondeu às perguntas  sobre o projeto.

Até o momento, nenhum estado aprovou medidas de fornecimento gratuito do absorvente. No Rio de Janeiro, a assembléia legislativa incluiu o item nos produtos da cesta básica, diminuindo assim a carga tributária aplicada e o valor final. Essa solução também é pautada em outros estados, como Rio Grande do Sul e Bahia.

No Paraná,  O deputado Boca Aberta Jr (PROS) apresentou um projeto de acessibilidade ao absorvente em dezembro de 2019. No entanto, o projeto se encontra parado desde janeiro na comissão de constituição e justiça da ALEP. Segundo ele, a demanda não seria prioritária, em decorrência de medidas relacionadas à pandemia do novo coronavírus.

Outra iniciativa parada, essa de âmbito nacional, é da deputada federal Tabata Amaral (PDT-SP). A proposta de distribuição é mais abrangente. Buscando assistenciar também mulheres de rua, absorventes seriam disponibilizados nos espaços públicos em geral. Dados de 2008 do Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) indicam que 18,4% dos moradores de rua já foram impedidos de receber ajuda na rede de saúde. O último avanço do projeto foi em março, 14 dias após ser apresentado.

Iniciativas Sociais

Na Korui, a cada 10 coletores vendidos pela empresa, um é doado. No entanto, não são feitas doações para pessoas de rua por conta do problema da higienização. A instituição afirma que as contribuições são feitas “para pessoas em vulnerabilidade social, mas que conseguem fazer a higienização do coletor de forma segura”.

Outro projeto de doações, feito pela Inciclo, é voltado à população carcerária. Recentemente, foram doados 3 mil coletores no Espírito Santo. A empresa vê a higiene menstrual como um direito da população, e acredita que a iniciativa traz “muitos benefícios para a saúde das detentas”. A Inciclo ainda ressalta que apesar do estado não oferecer itens de higiene menstrual, por outro lado, a população pode adquirir preservativos gratuitamente pelo SUS, serviço que já ocorre a 24 anos. O acesso ao absorvente poderia funcionar de modo parecido, argumenta a empresa.

Problema da educação

Para a Sociedade de Obstetrícia e Ginecologia do Paraná (Sogipa), além do problema do acesso, há também a falta de conhecimento sobre seu uso. De acordo com a Sempre Livre, 54% das mulheres não sabiam nada ou tinham poucas informações sobre menstruação no momento da menarca (primeira menstruação). A Sogipa argumenta que as informações deveriam ser mais difundidas, principalmente nas escolas, para evitar doenças. “A educação é válida em qualquer situação para prevenção, e a higiene íntima da mulher tem essa função”.  

Sustentabilidade

Os principais danos para o meio ambiente são a produção dos componentes do produto, como algodão e plástico, e o descarte indevido dos absorventes higiênicos. Estima-se que uma mulher, durante a vida, utilize mais de 10 mil unidades de absorventes descartáveis, gerando 150 kg de lixo. Veja o infográfico abaixo:

 

 

Segundo uma avaliação de ciclo de vida (LCA) do Royal Institute of Technology (Instituto Real deTecnologia) de Estocolmo, um dos impactos ambientais desses produtos era causado pelo processamento de matérias-primas, como a produção do plástico e da celulose, os quais compõem a parte interna dos absorventes. Esses componentes impedem a decomposição do material na natureza, portanto não são recicláveis.

O algodão é um produto utilizado nesses produtos que gera impactos ambientais significativos. Ele é uma fibra natural e, por conta das pragas agrícolas que influenciam na cultura (cultivo), sua produção exige o uso de pesticidas, inseticidas e fertilizantes, os quais permanecem no ecossistema e diminuem a fertilidade do solo, além de serem necessários cerca de 7 a 29 mil litros de água para cultivar 1kg de algodão.  

Os compostos químicos usados para a produção de absorventes descartáveis são derivados de árvores e petróleo, desde a sua produção até a decomposição, esses materiais causam impactos ambientais negativos. 

Os absorventes possuem, em sua composição, uma camada de celulose e um polímero absorvente, os quais são cobertos por polipropileno, que fica em contato com a pele. Outros compostos desses produtos são:

  • agentes controladores de odor;
  •  adesivos termoplásticos; 
  • papel siliconado;
  • propileno (tipo de termoplástico);
  • polietileno (polímero simples, tipo de plástico); 
  • polímero superabsorvente; 
  • celulose (gel que compõe o interior do absorvente, podendo ser substituído por algodão).

Existem alternativas sustentáveis ao absorvente descartável consistem em coletores e discos menstruais reutilizáveis, absorventes de pano e calcinhas absorventes. Os coletores e os discos menstruais são feitos de silicone hipoalergênico, pois são colocados no canal vaginal, podem ser utilizados por 8h contínuas e podem durar até 10 anos. As calcinhas absorventes possuem mais de uma camada e utiliza tecidos com finalidade impermeável e antibacteriana e após o uso podem ser lavadas e reutilizadas no próximo ciclo. Os absorventes de pano são feitos de algodão, com intuito de não abafar a região e possuem várias camadas, a intenção é que sejam lavados e reutilizados a cada ciclo e duram até 5 anos. 

 

A ginecologista, Lenira Gaede, diz que a escolha do método absorvente deve ser feita de acordo com as necessidades individuais de cada paciente e que isso deve ser feito em consulta após a explicação das vantagens e desvantagens de cada método. Mas alerta para a higiene necessária, sempre usar sabonete intimo e não dividir objetos íntimos, como os coletores e discos menstruais.

“ O questionamento dos “descartáveis” tomou conta de nós. Lembramos que nossas avós contavam que usavam panos de algodão dobrados presos com alfinetes nas calcinhas. As alergias eram inexistentes, gastava-se pouco e o planeta era mais verde. Mas como usar absorventes de pano em um mundo onde a praticidade é fundamental? Assim começou a nossa busca e nosso sonho de trabalhar com algo em que tivesse um impacto positivo para o nosso planeta tomava forma.” – Luísa Cardoso, idealizadora da Korui (Loja virtual de métodos absorventes alternativos)

A Korui é uma das lojas nesse meio, foi idealizada por Luísa e seu marido Pedro enquanto viajavam a trabalho voluntário, eles estavam em busca de realizar algo que pudesse fazer a diferença na vida das pessoas. E entre outras coisas se depararam com uso de absorventes descartáveis que além nocivos a saúde e  meio ambiente, são desconfortáveis e inacessíveis. 

Algumas das vantagens dos métodos alternativos é que eles não possuem químicos fortes como os descartáveis, buscam ser menos nocivos ao meio ambiente e tem longa vida útil, para ajudar mais nesse quesito. A Korui percebe um aumento nas vendas, diz acreditar que as pessoas estão se abrindo a coisas novas, e por estarem mais tempo em casa se permitem testar coisas reutilizáveis,.

 

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