Violência obstétrica causa danos psicológicos às gestantes

Práticas médicas inadequadas podem ser denunciadas ao Conselho Regional de Medicina
Por Sofia Magagnin
No Brasil, uma em cada quatro mulheres é vítima de violência obstétrica de acordo com o relatório Mulheres brasileiras e Gênero nos espaços público e privado, divulgado pela Fundação Perseu Abramo em 2010. A discussão sobre esse tema levanta questionamentos relacionados ao tratamento dado às gestantes no Sistema Único de Saúde (SUS) e nas redes hospitalares privadas. A forma com que é realizado o atendimento durante o período gestacional pode afetar, emocionalmente, a vida das futuras mães.
Segundo a ginecologista, obstetra e Conselheira do Conselho Regional de Medicina do Paraná (CRM-PR), Regina Piazzetta, a violência obstétrica se caracteriza como todo ato de desrespeito, assédio, abuso e negligência que engloba todos as categorias profissionais envolvidas nos processos de assistência à gestante, que vai desde o primeiro contato com a grávida até o momento do nascimento.
A técnica em Enfermagem Rosemary Mulhman, 40 anos, sofreu, na própria pele, a violência obstétrica. Durante o parto, ouviu do médico e da equipe assistencialista frases que considera humilhante. Além disso, foi proibida de entrar no centro obstétrico com um acompanhante, o que é garantia da gestante de acordo com a lei nº 11.108 de 07 de abril de 2005.
Segundo a vítima, a parte que mais lhe dói, até mais do que a dor do próprio parto, são as memórias que guardou de tudo o que sentiu enquanto era agredida verbalmente. “São lembranças bem dolorosas”, recorda.
Para a psicóloga Daiane Vieira, que tem especialização em análise de comportamento, a violência obstétrica acontece quando há um negligenciamento assistencial. “É o processo de invalidar o outro, o sentimento, a dor física e emocional”, explica. Segundo ela, para realizar um atendimento, o médico e sua equipe devem seguir as diretrizes instituídas pelo conselho de cada categoria profissional. Nessa circunstância, se configura violência obstétrica quando essas normas não são cumpridas, em relação ao tratamento oferecido às gestantes e às intervenções processuais e cirúrgicas não recomendadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
Em geral, qualquer tipo de violência pode causar danos psicológicos e mentais, mas o trauma que envolve a violência obstétrica, em especial, pode desencadear uma síndrome pós-traumática, um transtorno e despertar as sensações de medo e inutilidade na mulher. Além de, claro, poder se manifestar na forma de uma depressão pós-parto e de dificuldade em se relacionar com o bebê. “Os prejuízos psicológicos são de extrema importância”, alerta a psicóloga.
Para o ginecologista, obstetra e professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Dênis José Nascimento, no ambiente da maternidade a mulher deve ser tratada com muita atenção e carinho e a equipe deve promover uma assistência que traga resultados positivos. “A paciente tem que receber a melhor assistência do ponto de vista médico, psicológico e, principalmente, em uma avaliação coparticipativa com os colegas de outras especialidades”, argumenta.
As denúncias de condutas médicas inadequadas devem ser feitas ao CRM-PR, órgão capacitado para fazer o julgamento técnico do ocorrido. Com a identificação da vítima, a denúncia pode ser protocolada diretamente no site do Conselho (crmpr.org.br/). É aberta uma sindicância após o recebimento de denúncia.
Doulas buscam reconhecimento profissional
Companheiras de gestação, as doulas ainda têm dificuldade para frequentar os centros obstétricos
A presença constante das doulas em maternidades tem dado destaque à categoria profissional, que conta há dois anos, à nível municipal, com a existência da Associação de Doulas de Curitiba e Região Metropolitana (Adouc).
De acordo com a presidente da Adouc, Patrícia Teixeira, as doulas fazem o acompanhamento da gravidez e realizam um atendimento físico, emocional e informativo com foco no bem-estar das gestantes.
Em Curitiba, a Lei Municipal de Curitiba 14.824 de 2016 já autoriza a presença das doulas nos hospitais. Patrícia acredita que apesar da exigência de cursos de formação, a categoria ainda não é devidamente reconhecida dentro da área de atuação e isso é evidenciado na dificuldade que as profissionais têm para receber autorização de entrada nos centros obstétricos. “Na hora que a mulher precisa, a gente não pode apoiar”, relata.
Agora, as integrantes da Associação aguardam a realização de uma audiência pública para discutir a humanização dos partos e a profissionalização das doulas.